terça-feira, 2 de agosto de 2011

Museu de rua

Autor: Prof. Márcio Rubens - Historiador
Óbidos – 2006

OBS: Texto extraído do TCC “Museu de Rua & Patrimônio Histórico: Políticas Culturais e Memória Social em Óbidos (1989 – até os dias atuais)”.

1 – MUSEU CONTEXTUAL.
Surge uma nova questão a ser discutida, o que é o Museu Contextual?
Neste sentido, um dos idealizadores do projeto João de Jesus Paes Loureiro afirma na primeira publicação em trabalho de mesmo porte verificado sobre o Município de Cametá:
“Patrimônio Contextualizado visa o estabelecimento de um processo crítico pedagógico, com alcance social ampliado, tendo por base ações culturais sobre o Patrimônio Histórico local tendo como estratégia nuclear à criação do Museu Contextual, que consiste na fixação de painéis artisticamente concebidos à frente dos prédios históricos da cidade, cada painel, contendo textos informativos (levantamento historiográfico e arquitetônico), fotos (há exceções) e gráficos que demonstram à população, a História, o valor estético e afetivo de cada prédio, aspirando que, pelo conhecimento da importância cultural das edificações, a população, como um todo desenvolva um processo de afetividade e atos de preservação desses bens (...). O que significa, salvar sua própria alma visível na Arquitetura que no peito das cidades é seu coração pulsante”.[1]
Este projeto – amparado pelas diretrizes do Fórum Estadual de Cultura do Pará, que desde 1987 vinha realizando uma série de reuniões entre os representantes dos Municípios do Estado, de suas Secretarias, artistas, grupos folclóricos, intelectuais, etc., no intuito de estabelecer intercâmbios culturais desses municípios entre si e dos mesmos com a capital, Belém, como forma de valorizar e desenvolver a cultura deste Estado. Este Fórum regulamentava: Estudos e Pesquisas, Fomento às Manifestações da Arte e Cultura Popular, Implementação de Organismos e Espaços Culturais, Difusão e Intercâmbio Cultural, Formação e Aperfeiçoamento de Recursos Humanos, Patrimônio Histórico Contextualizado – trazia junto de si diversos outros projetos que concomitantemente eram desenvolvidos para que pudessem ser atingidas o maior número possível de pessoas, assim como, tinha por objetivo a atuação nos diversos ramos de atividade profissional e/ou educacional.
Assim evidenciado então, o Museu de Rua[2] apresentou e ainda apresenta características que lhe são peculiares devido à forma como foi colocado para a sociedade obidense, mais ainda assim há o enfoque vivificado pelo conteúdo de suas placas. Sendo que estas trazem consigo informações sobre os aspectos Arquitetônico e Historiográfico do ambiente citadino, colônia e várzea, que em muito contribui para a informação e identificação do estilo eclético das construções contrastando com os estilos colonial, moderno e contemporâneo que se apresentam nos prédios localizados no Centro Histórico da cidade e seu entorno. Além de que também contribui para a eventual percepção das realidades vivificadas no cotidiano dos primeiros moradores do município, o que nos leva à percepção de valores, crenças, tendências políticas, aspirações sociais e econômicas, de um indivíduo, grupo familiar, e acima de tudo, de toda a sociedade obidense durante os séculos.
Através da identificação e evidência das relações que os próprios indivíduos mantinham com as atividades econômicas, como a coleta de produtos florestais, como a castanha-do-pará, cumarú, mandioca, cacau, juta, a produção para a venda semanal de produtos como o tomate, a melancia, melão, jerimum ou abóbora; as atividades pesqueiras, que se desenvolve em função da captura da dourada, filhote, mapará, que não são muito consumidos na cidade – a não ser em locais mais afastados do centro – onde se concentra parte da elite local devido à grande variedade de espécies de peixes brancos, ou seja, de escamas, que são muito mais apreciados do que os peixes lisos, peixes de pele, destacando-se entre eles o jaraqui, tambaqui, pirapitinga, tucunaré, pescada, pirarucu, curimatãs, pacú, branquinha, matrinchã, acari, apapá branco e amarelo (sarda), aracú e vários outros tipos.
Para se ter um panorama geral do município, em frente temos o rio amazonas e ao atravessá-lo nos deparamos com uma parte da várzea, a costa fronteira como é denominada, que já serviu como tema de muitas poesias, músicas, crônicas, obras literárias; como a História de um Pescador[3]. Sobre o rio, a Geografia e a História o tem evidenciado como o local mais estreito de seu percurso onde foi erguido o Forte Pauxis em 1697, que serviu de referencial para o surgimento da cidade[4]. É conseqüentemente o local mais profundo de todo o seu leito desde a nascente até o delta de escoamento no atlântico. Medidas a parte, é conhecido pela grande variedade de peixes que possui.
À esquerda, descendo-se o Amazonas, nos deparamos imediatamente com a Serra da Escama, local onde foi instalada uma guarnição no início do século XX para uma melhor visão e defesa da região, aí já apresentando armamento mais sofisticado como os canhões Armstrong retirado do Navio-Escola Benjamim Constant[5]- diferente daqueles que constam ainda hoje no Forte Pauxis, que são do século XVII – devido à altura da serra uma pessoa pode visualizar o lago que existe por trás da costa fronteira e a boca do rio trombetas.
Hoje este ambiente ficou um pouco esquecido da sociedade, mas muitos aventureiros ainda visitam o local – apenas não encontram mais um relógio do sol, feito de metal que ali se encontrava há vários anos atrás, provavelmente foi vendido como sucata – percorrendo uma trilha ecológica que inicia na margem do Lago Pauxis e que vai até o topo, local onde a Defesa Gurjão foi instalada. O lago localiza-se entre a Serra e parte da cidade e no período da estiagem os proprietários de olaria (pequenas empresas de beneficiamento), ali próximo, aproveitam para retirar a argila ou barro para empregar na confecção de tijolos, telhas, matrizes de máscaras para o “mascarado fobó”,[6] gerando emprego e renda para muitos obidenses.
Do lado oposto da cidade, à direita, encontra-se o local denominado Jeretepaua, que possui um ecossistema que mantém várias espécies de animais, vegetais, frutas, etc.
Ao fundo, adentrando pelo território da cidade encontram-se diversas localidades como o curumu, onde ocorre o festival do tucunaré; o flexal onde se dá o festival do acari; o mamauru; o cipoal; o rio branco; etc. Mas antes de chegar em muitos destes locais, para-se no engenho ou curuçambá que são balneários a poucos quilometros de distância que circundam também o município.
O patrimônio cultural tem contribuído em muito para as atividades poéticas, musicais e culturais do município devido à estreita relação que o indivíduo mantém com o ambiente local. Afinal muitos indivíduos retiram dali o seu sustento e de sua família principalmente na época da piracema (subida do rio de cardumes de peixes), transporte, diversão e lazer como ir passar o dia na praia e comer peixe fresco (normalmente ainda estão vivos) moqueado na hora, o avoado como se conhece em outras regiões, ali mesmo de preferência sem utilizar talheres, mas apenas as mãos e depois tomar um bom banho ali mesmo, claro que não se dispensa à presença de um bom violeiro e a garrafa de aguardente.
O rio amazonas contribui diretamente para a vida dos indivíduos residentes no centro urbano e seus arredores, quero dizer que ele é ativo participante na modificação das estruturas socioeconômicas do local, e serve como um instrumento de estabilidade e desequilíbrio, visto aqui no sentido das mudanças que ocorrem em seu período de cheia, mas não considerado como um tipo destrutivo apenas do equilíbrio natural, afinal, o próprio período de cheia possui sua lógica de ser e contribui para manter as características do ecossistema que o envolve, como através da fertilização dos solos, a interligação dos rios com diversos lagos, o que contribui para a renovação e perenidade da vida em todos os seus meandros.
Lembremos que foi através do rio que chegaram a Óbidos vários navios de grande porte e sua tripulação, caixeiros viajantes, embarcações à vapor da Companhia de Navegação e Comércio da Amazônia de propriedade do Barão de Mauá, que fazia a linha Belém-Manaus[7], imigrantes, tecidos, louças, cervejas, vinho, redes, e outros artigos que contribuíram para o desenvolvimento econômico e sociocultural local.



[1] PLACAS. Museu contextualizado. Cametá – Pa.
[2] Utilizarei esta denominação para me reportar ao Museu Contextual.
[3] LUIZ DOLZANI. “História de um pescador; scenas da vida do amazonas. Secult; Belém, 1990.
[4] REIS, Arthur César Ferreira. “História de Óbidos”. Civ. Brasileira; RJ, 1979. Pp.18.
[5] PLACAS, N° 40. Defesa Gurjão ou Fortaleza Gurjão (Serra da Escama).
[6] Denominação empregada ao personagem principal do carnaval de rua em Óbidos, cujo, apresenta-se vestindo um “dominó” ou macacão de chita que encobre quase todo o corpo, ficando apenas as mãos, pés e cabeça, de fora. Mas estas partes são cobertas com luvas, calçados, máscara e capacete. O mascarado utiliza ainda como parte de sua indumentária, uma bexiga (de boi) seca e cheia de ar que utiliza para dar lambada nos brincantes, além do mais, utiliza a maisena, que usa para “sujar” de pó branco os foliões. O objetivo é permanecer irreconhecível durante a brincadeira, senão o Marcarado Fobó ficará manjado (todos saberão quem ele é).
[7] PLACAS. . N° 02. Agência do Correio Municipal.

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